A procuração, instrumento público,
onde uma pessoa outorga a outra pessoa poderes, é um documento de grande complexidade,
podendo resultar em consequências surpreendentes àquela pessoa que outorgou poderes
à pessoa de estimada confiança.
As pessoas interessadas, outorgante e
outorgada, se dirigem ao Tabelião de Notas, onde é lavrada a procuração pública.
A outorgante, pessoa que nomeia e
constitui como sua procuradora a pessoa denominada outorgada, confere poderes à
outorgada que podem ser “os mais amplos, gerais e ilimitados para gerir e
administrar todos os seus negócios e interesses”, podendo representá-la em
diversas instituições como, por exemplo: a) repartições públicas; b) tabeliães
de notas; c) registros de imóveis; d) Junta Comercial do seu Estado; e) DETRAN;
f) Bancos – Banco do Brasil S.A., Banco Central do Brasil; podendo, ainda, como
exemplo: a) requerer certidões, averbações, registros; b) assinar, alterar,
rescindir, retificar, ratificar, contratos particulares; c) receber quaisquer quantias
devidas à outorgante; d) vender, comprar, alienar ou onerar, bens móveis,
imóveis; e) dar ou contrair empréstimos e financiamentos; f) abrir, movimentar, transferir e encerrar
contas-correntes.
Lavrada a procuração a pessoa
outorgada passa a representar a outorgante podendo agir de acordo com o elenco
de poderes assinalados no instrumento.
Ocorre que, a pessoa outorgante,
estando confiante na administração da pessoa outorgada pode deixar de ter
notícias dos seus bens e negócios e começar a ser surpreendida com o resultado da
sua outorga.
A pessoa outorgada pode constituir uma
empresa, onde a pessoa jurídica pode ser utilizada para negociações das mais
variadas como, por exemplo, a procuradora abrir uma conta corrente em nome da
pessoa jurídica, com a finalidade de angariar o valor do limite do cheque
especial, utilizar os valores, ficando como devedora diante da instituição
bancária, aquela pessoa jurídica, cuja representante legal é a outorgante.
Ainda, constituída a pessoa jurídica
pela outorgada, a outorgada pode fazer compras em nome daquela pessoa jurídica
constituída, com a pretensão dos produtos comprados serem entregues pelo
fornecedor a outra pessoa jurídica diversa da relação da outorgante.
Caso os produtos comprados não sejam
pagos de acordo com o expresso na nota fiscal, a responsável pelo pagamento é a
pessoa jurídica constituída pela outorgada, impactando o seu representante
legal, no caso a outorgante, que por vezes nem sabe que foi constituída uma
pessoa jurídica e muito menos que procede a negociações.
A pessoa outorgada pode, também,
vender bens imóveis, como casas, apartamentos, terrenos, sítios, fazendas,
proceder a assinatura do respectivo contrato de compromisso de venda e compra,
assinar a escritura de compra e venda, apossar-se dos valores e desfazer-se do
dinheiro, sem conhecimento da outorgante.
Ainda, a pessoa outorgada, com o
dinheiro amealhado de uma venda de um bem móvel pode usufruir do dinheiro,
aplicando-o em negócio estabelecido na procuração.
Além disso, a pessoa outorgada diante
dos poderes que lhe foram outorgados pode, inclusive, emprestar o dinheiro da
outorgante a um amigo seu o beneficiando às custas da outorgante.
Todos esses atos praticados são legais
diante do teor da procuração outorgada, mas ilícitos diante dos bens e negócios
da outorgante, pois seu patrimônio está sendo dilapidado “legalmente” a seu
desfavor.
A pessoa outorgante pode levar muito
tempo para notar os atos da pessoa outorgada e, inclusive, ter dificuldade em
perceber as consequências dos atos da sua procuradora, em virtude da confiança
havida entre elas.
A falta de prestação de contas da
administração é um ponto preponderante a ser alertado, pois tal conduta é
indicativo de algo errado.
A menor dúvida sobre os atos da pessoa
outorgada e sem nenhuma satisfação da administração, cabe a pessoa outorgante
revogar a procuração, imediatamente, dirigindo-se a um Tabelião de Notas, a fim
de lavrar-se a revogação de procuração.
E ocorrendo a revogação expressa de
todos os poderes conferidos na procuração e a negativa a prestação de contas,
cabe a pessoa outorgante promover a devida ação judicial, ação de exigir
contas, com a finalidade de que a pessoa outorgada apresente as contas de forma
mercantil, discriminando as receitas e aplicações, devidamente acompanhadas dos
documentos comprobatórios e no caso de indicação de gastos será imprescindível
e indispensável que sejam comprovados com os recibos ou notas fiscais
correspondentes.
O Código Civil se reporta ao mandato
nos artigos: 653 a 666 - Disposições Gerais, 667 a 674 - Das Obrigações do
Mandatário, 675 a 681 - Das Obrigações do Mandante, 682 a 691 e – Da Extinção
do Mandato.
Destacam-se:
o artigo 653: “Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes
para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o
instrumento do mandato.”; o artigo 661: “O mandato em termos gerais só confere poderes de administração. §
1o Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar
outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a
procuração de poderes especiais e expressos.”; o artigo 668: “O mandatário é obrigado a dar contas de sua gerência
ao mandante, transferindo-lhe as vantagens provenientes do mandato, por
qualquer título que seja.”; o artigo 669: “O mandatário não pode compensar os
prejuízos a que deu causa com os proveitos que, por outro lado, tenha granjeado
ao seu constituinte.”; o artigo 670: “Pelas somas que devia entregar ao
mandante ou recebeu para despesa, mas empregou em proveito seu, pagará o
mandatário juros, desde o momento em que abusou.”; e o artigo 682: “Cessa
o mandato: I - pela revogação ou pela renúncia;”.
O Código de Processo Civil dispõe
acerca da ação de exigir contas nos artigos 550 a 553.
Ressaltam-se:
o artigo 550: “Aquele que
afirmar ser titular do direito de exigir contas requererá a citação do réu para
que as preste ou ofereça contestação no prazo de 15 (quinze) dias. § 1o Na petição inicial, o autor especificará,
detalhadamente, as razões pelas quais exige as contas, instruindo-a com
documentos comprobatórios dessa necessidade, se existirem. §
2o Prestadas as contas, o autor terá 15 (quinze) dias
para se manifestar, prosseguindo-se o processo na forma do Capítulo X do Título
I deste Livro. § 3o A impugnação
das contas apresentadas pelo réu deverá ser fundamentada e específica, com
referência expressa ao lançamento questionado. § 4o Se
o réu não contestar o pedido, observar-se-á o disposto no art. 355. § 5o A decisão que julgar
procedente o pedido condenará o réu a prestar as contas no prazo de 15 (quinze)
dias, sob pena de não lhe ser lícito impugnar as que o autor apresentar. § 6o Se o réu apresentar as contas
no prazo previsto no § 5o, seguir-se-á o procedimento do § 2o,
caso contrário, o autor apresentá-las-á no prazo de 15 (quinze) dias, podendo o
juiz determinar a realização de exame pericial, se necessário.”; o artigo 551:
“As contas do réu serão apresentadas na forma adequada, especificando-se as receitas,
a aplicação das despesas e os investimentos, se houver.”; e o artigo 552: “A
sentença apurará o saldo e constituirá título executivo judicial.”.
A Lei n° 8.935, de 18 de novembro de
1994, Lei dos Cartórios, dispõe sobre serviços notariais e de registro.
Evidenciando-se: o artigo 1º: “Serviços notariais e de registro são os de
organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade,
autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.”; o artigo 3º: “Notário,
ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do
direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade
notarial e de registro.”; o artigo
7º: “Aos tabeliães de notas compete com exclusividade: I - lavrar
escrituras e procurações, públicas;”; e o artigo 8º:
“É livre a escolha do tabelião de notas, qualquer que seja o domicílio das
partes ou o lugar de situação dos bens objeto do ato ou negócio.”.