terça-feira, 31 de janeiro de 2023

DA REALIZAÇÃO DE OBRAS NO CONDOMÍNIO EDILÍCIO RESIDENCIAL

    As obras de interesse geral do condomínio edilício residencial devem ser aprovadas em assembleia condominial?

    Qualquer obra tem de ter aprovação em assembleia condominial?

   Para qualquer obra de interesse geral do condomínio é necessária a deliberação, a votação e aprovação em assembleia dos condôminos que são os proprietários das unidades autônomas.

    Mas o que é uma obra em um condomínio?

    Uma obra é definida na Lei n° 8.666, de 21 de junho de 1993, que regula o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal, que em seu artigo 1° estabelece: “Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.”.

    Diante do artigo 6°, inciso I, da Lei n° 8.666/1993, dispõe-se o que é uma obra: “Art. 6o Para os fins desta Lei, considera-se: I - Obra - toda construção, reforma, fabricação, recuperação ou ampliação, realizada por execução direta ou indireta;

     A obra em condomínio edilício residencial é uma benfeitoria.

     Mas existem diferentes benfeitorias em um condomínio residencial?

   Sim, existem diferentes benfeitorias e podem ser de três espécies: a) benfeitorias voluptuárias; b) benfeitorias úteis; e c) benfeitorias necessárias.

    As espécies de benfeitorias estão dispostas no artigo 96 do Código Civil: “Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. § 1o São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor. § 2o São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem. § 3o São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore.”.

   Assim, benfeitorias voluptuárias são referentes ao embelezamento do condomínio, como a colocação de vasos com plantas ornamentais nos espaços exteriores do condomínio como a área da piscina, a colocação de vasos de flores nas áreas comuns do condomínio como o hall de entrada do condomínio.

    As benfeitorias úteis são relacionadas a facilitação do condomínio, como o sistema de segurança de reconhecimento facial na entrada do condomínio, em geral nos portões de pedestres para facilitar a entrada e saída dos moradores.

    E, as benfeitorias necessárias são aquelas como a impermeabilização de uma laje ou a realização de rampa de acesso de entrada e saída de pessoas em cadeira de rodas.

  Porém, as benfeitorias devem ser de conhecimento dos condôminos, isto é, dos proprietários das unidades autônomas, conforme disposto no artigo 97 do Código Civil: “Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.”.

   Por conseguinte, as deliberações em um condomínio devem ser tratadas em assembleia e compete ao síndico convocar a assembleia, conforme disposto no inciso I do artigo 1.348 do Código Civil, e se caso o síndico não convocar assembleia, a assembleia extraordinária poderá ser convocada por um quarto dos condôminos, de acordo com o artigo 1.355 do Código Civil.

    Ainda, dispõe o artigo 1.341 do Código Civil sobre a realização de obras no condomínio e a votação pelos condôminos se as obras são voluptuárias, ou úteis ou necessárias: “Art. 1.341. A realização de obras no condomínio depende: I - se voluptuárias, de voto de dois terços dos condôminos; II - se úteis, de voto da maioria dos condôminos. § 1o As obras ou reparações necessárias podem ser realizadas, independentemente de autorização, pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer condômino. § 2o Se as obras ou reparos necessários forem urgentes e importarem em despesas excessivas, determinada sua realização, o síndico ou o condômino que tomou a iniciativa delas dará ciência à assembleia, que deverá ser convocada imediatamente. § 3o Não sendo urgentes, as obras ou reparos necessários, que importarem em despesas excessivas, somente poderão ser efetuadas após autorização da assembleia, especialmente convocada pelo síndico, ou, em caso de omissão ou impedimento deste, por qualquer dos condôminos. § 4o O condômino que realizar obras ou reparos necessários será reembolsado das despesas que efetuar, não tendo direito à restituição das que fizer com obras ou reparos de outra natureza, embora de interesse comum.”.

    Além do Código Civil há normas na Convenção Condominial referentes a deliberação de assuntos referentes às obras, bem como o Regulamento Interno do condomínio, que devem ser tratadas via assembleia condominial, pois os assuntos do condomínio são de interesse geral de cada condômino, ou seja, de cada proprietário de unidade autônoma.

     Eis o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

CONDOMÍNIO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO. OBRAS EM ÁREA COMUM. NECESSIDADE DE APROVAÇÃO PRÉVIA PELA MAIORIA DOS CONDÔMINOS EM ASSEMBLEIA REGULARMENTE CONVOCADA. QUÓRUM MÍNIMO NÃO OBEDECIDO. IRREGULARIDADE CONFIGURADA, A ENSEJAR A PROCEDÊNCIA DO PEDIDO DE RESSARCIMENTO. RECURSO IMPROVIDO, COMOBSERVAÇÃO. 1. A realização da obra em área comum, na forma do artigo 1.341 do Código Civil, só pode ser admitida após aprovação pela maioria dos condôminos em assembleia geral devidamente convocada. Porém, não foi obedecido o quórum mínimo antes da execução da obra, irregularidade que enseja o acolhimento do pedido de desfazimento. 2. Diante desse resultado, por incidência do artigo 85, § 11, do CPC, impõe-se elevar o valor dos honorários advocatícios de responsabilidade do réu a 15%, do valor atualizado da causa. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 1063246-85.2016.8.26.0100, Comarca: SÃO PAULO, 42ª Vara Cível, Juiz: Renato de Abreu Perine, Apelante: Condomínio Edifício Solar Castro Alves, Apelado: Pietro Eugenio Foresi, Interessado: Graiche Construtora e Imobiliária Ltda., Relator: Antonio Rigoli, Órgão julgador: 31ª. Câmara de Direito Privado, Data do julgamento: 23/09/2022, Data da publicação: 23/09/2022) (realces nossos)

Existe uma norma que trata sobre obras em condomínio?

Sim, a ABNT, Associação Brasileira de Normas Técnicas, apresenta a Norma Brasileira n° 16.280/2014, ABNT NT 16.280:2014, que trata de reforma em edificações, do sistema de gestão de reformas e sobre requisitos; determinando que todas as obras realizadas dentro do condomínio passem pela anuência do síndico e, em alguns casos, de um engenheiro ou arquiteto.

    É importante trazer ao conhecimento a Introdução da ABNT NT 16.280:2014:

Introdução. O tema “reforma de edificações” assume relevância na sociedade à medida que, com a existência de demanda, do crescimento das cidades e urbanização de novas regiões, passa a ser atividade a ser disciplinada na sua forma de gestão. O envelhecimento das obras construídas impõe determinados processos, por segurança, perda de função ou qualidade que devem ser conduzidas com base em requisitos bem definidos. Mudanças econômicas e culturais trazem necessidades que podem levar a processos de alteração das construções. Contudo, estas transformações devem preservar a segurança das edificações, seus usuários e o entorno por ela impactados. Obviamente, em toda atividade existe a presença do elemento “risco" que, nas análises de gestão, deve ser tratado adequadamente. As edificações cumprem funções de serviço definidas em projeto. Contudo, ao longo do tempo de serviço, existirão necessidades de ajustes, adequações a novas demandas e até mesmo recuperação de suas propriedades técnicas. O valor agregado às edificações, seja econômico ou social, normalmente é evidenciado por características que sustentam as atividades humanas de forma estruturada, passando por gerações e fazendo história. (realces nossos).

    Quanto às áreas comuns do condomínio a ABNT NT 16.280:2014, dispõe: “Além do prescrito em 5.2, todas as reformas devem atender às normas técnicas existentes e legislações vigentes, bem como devem ser alinhadas ao plano de gestão de manutenção, conforme ABNT NBR 5674. Devem também atender aos requisitos de registros e arquivamento das documentações.” (realces nossos).

    Portanto, benfeitorias em condomínio têm relevância normativa e técnica que devem ser cumpridas. 

segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

DOS INCONVENIENTES DA PORTARIA ELETRÔNICA NO CONDOMÍNIO RESIDENCIAL

    A portaria eletrônica é uma inovação tecnológica aplicada ao bem comum e a segurança das pessoas que vivem em um condomínio edilício residencial, ou seja, em um prédio de edifício residencial.

    Na portaria eletrônica não há a figura do colaborador do condomínio ou do colaborador de uma empresa terceirizada em portaria, denominada de porteiro.

    No interior da portaria, não há uma pessoa física trabalhando com a finalidade de atender: a) pessoas que chegam da rua para entrarem no condomínio, como moradores, visitantes, colaboradores dos apartamentos, funcionários do condomínio e prestadores de serviços; b) o colaborar do correio com a entrega de cartas e de encomendas; c) corretores de imóveis ou consultores imobiliários que irão apresentar imóveis do condomínio a pretendentes a compradores ou locatários de uma unidade do condomínio; d) pessoas trazendo presentes, flores, para um morador aniversariante ou que tenha um recém-nascido; e) um profissional para consertar algo no imóvel do morador; f) um morador que vai deixar a chave do seu imóvel, pois tem de sair, e está aguardando um familiar, ou um amigo, ou um colaborador; g) um morador que se acidentou a noite dentro do seu imóvel e precisa de um socorro; h) um morador que acorda no sábado e encontra a cortina de sua sala molhada em virtude de água jogada pelo morador ou colaborador da unidade de cima; i) um morador que tem o vidro da janela de seu banheiro atingida por um recipiente de shampoo arremessado de um andar de cima no fim de semana; j) um morador que vê um guarda-sol voando do alto do prédio vizinho em um fim de tarde de sábado a ponto de se atingir a janela de uma das unidades do condomínio a pouco minutos de uma tempestade.

    São alguns exemplos de ocorrências em que o morador estando na sua unidade pode sofrer e não ter a presença do zelador por não ser o horário do expediente de trabalho dele e do morador não poder se socorrer do auxílio do porteiro.

    Assim, com a implantação da portaria eletrônica, o morador pode se sentir um “órfão” no seu condomínio, isso porque nas situações indicadas além de não ter porteiro, pessoa física, também possa não se encontrar o zelador no condomínio, em razão de não residir no condomínio, ou ter encerrado o seu expediente de trabalho, ou ser domingo ou feriado, no momento de infortúnio, e, além disso, pode até não ter a presença física de um síndico, em função da figura do síndico profissional, síndico que não precisa ser morador ou proprietário de unidade no condomínio, ou seja, não reside no condomínio.

    Logo, o morador que residir em um condomínio com portaria eletrônica e sem o zelador, se sofrer um infortúnio pode não ter nem o auxílio imediato do síndico, pois o Código Civil dispõe que o síndico poderá não ser um condômino: “Art.  1.347. A assembleia escolherá um síndico, que poderá não ser condômino, para administrar o condomínio, por prazo não superior a dois anos, o qual poderá renovar-se.”, ou seja, quando a norma se reporta que o síndico poderá não ser condômino, tem-se a figura do síndico profissional, outra inovação nos condomínios edilícios residenciais, além da portaria eletrônica.

    A implantação da portaria eletrônica só poderá ocorrer nos ditames estabelecidos na Convenção Condominial e do Regulamento Interno do Condomínio, com a aprovação em assembleia condominial dos condôminos, que são proprietários das unidades, após a votação dos condôminos em assembleia, assembleia convocada pelo síndico, pois a portaria eletrônica é um benefício ao condomínio, isto é, é uma benfeitoria útil, porque facilita a utilização do condomínio (§ 2o   do artigo 96 do Código Civil).

    Assim, devem-se respeitar também as normas do Código Civil: “Art. 96. As benfeitorias podem ser voluptuárias, úteis ou necessárias. § 1o  São voluptuárias as de mero deleite ou recreio, que não aumentam o uso habitual do bem, ainda que o tornem mais agradável ou sejam de elevado valor. § 2o  São úteis as que aumentam ou facilitam o uso do bem. § 3o  São necessárias as que têm por fim conservar o bem ou evitar que se deteriore. (realces nossos)” ; “Art. 97. Não se consideram benfeitorias os melhoramentos ou acréscimos sobrevindos ao bem sem a intervenção do proprietário, possuidor ou detentor.”; “Art. 1.348. Compete ao síndico: I - convocar a assembleia dos condôminos;”; “Art. 1.335. São direitos do condômino: ...III - votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite.”; “Art. 1.334. Além das cláusulas referidas no art. 1.332 e das que os interessados houverem por bem estipular, a convenção determinará: ...III - a competência das assembleias, forma de sua convocação e quórum exigido para as deliberações; ...V - o regimento interno.”; “Art. 1.331. Pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclusiva, e partes que são propriedade comum dos condôminos.”.

    Diante do exposto, apresenta-se uma lista de relatos de condôminos, locatários, moradores, visitantes, prestadores de serviço, resultantes da portaria eletrônica: a) “com a portaria eletrônica as pessoas ficam aguardando em torno de 10 (dez) minutos para poderem entrar no condomínio, com o risco de serem “assaltados”, ou seja, de serem furtados ou até sequestrados na frente do condomínio”; b) “em dia de chuva as pessoas aguardam e aguardam, pois o funcionário da empresa responsável pelo sistema de segurança demora na identificação e na autorização de entrada ao condomínio”; c) “quanto à entrega de um presente, a pessoa espera e espera e não pode simplesmente entregar na portaria sem incomodar o morador, porque não tem como, em razão de não ter porteiro, e fica, por vezes, parecendo que foi fazer uma visita ao morador sem avisar, porque o morador tem de descer para ir buscar”; d) “e como fica a situação de uma pessoa que espera autorização para entrar e se aparece um morador vindo da calçada e o portão abre a pessoa aproveita e entra junto com o morador?” “se for visita bem-vinda pelo morador o transtorno é menor em atendê-lo, todavia, se for um ex-namorado, um ex-marido não querido, que não ser quer atender e bate a sua porta sem autorização?” “e se fosse um criminoso “e se fosse uma pessoa mal intencionada?”; e) “se a pessoa é uma pessoa má intencionada entra junto com um morador ao abrir o portão, escolhe um andar e um apartamento e se o apartamento não estiver com a porta trancada, essa pessoa entra e furta e rouba e/ou comete um homicídio”.

    De quem será a responsabilidade civil e criminal em tantas hipóteses? Do síndico que propôs a inovação tecnológica? Dos condôminos que aprovaram o benfício em assembleia? Da empresa contratada de portaria eletrônica? Do funcionário responsável pelo sistema de segurança? Do morador que estava no seu direito de entrar e junto entrou a pessoa que aguardava? Do condômino que nem sequer sabia da entrada de pessoa junto com outro morador?

    E, ainda, um condômino que tem de receber um mandado de citação, documento referente a uma ação judicial promovida em face dele e esse morador ao receber a informação do funcionário responsável pelo controle de acesso de pessoas, informa a esse funcionário que ele não se encontra, desta forma, o Oficial de Justiça não conseguirá entregar a citação?

    Mas, também, como fica no caso de um investigador de polícia que tem de entregar um mandado de intimação a um morador para comparecer a uma delegacia de polícia e o funcionário do controle de acesso recebe do morador uma negativa de receber o servidor, pedindo para informar que não se encontra no apartamento e nem em outro local do condomínio?

    Portanto, será que em prol de abaixar valores das taxas condominiais os condôminos terão real satisfação numa benfeitoria que resulta em tantos transtornos?